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A Marquesa de Marvila

Aqui não se aprende nada... Lêem-se coisas escritas por mim, parvoíces na maioria das vezes mas sempre, sempre verdades absolutas (pelo menos para mim).

Ponham-se, por um segundo, no nosso lugar!

Ontem surgiu um vídeo na internet de um directo em que um sujeito, não só assumia, como se regozijava com o facto de ter violado uma rapariga!

Todas as pessoas, decentes, ficaram chocadas! Partilhas na net, nas diversas redes sociais, críticas, choque, entranhas reviradas... eu inclusive!

Depois do choque inicial, apercebi-me, tristemente, que afinal não era um choque. É expectável! Aquilo que o sujeito fez é "normal" numa sociedade como a nossa. Vangloriar-se, em público, não é mais do que se tem feito nos cafés, nos grupos privados de machos, onde algumas mulheres também entram e acham normal, afinal "ela estava a pedi-las"...

Para as mulheres não é novidade este tipo de situações, neste caso levado ao limite que é a violação. Não há mulher no mundo que nunca tenha sido assediada, que nunca tenha tido medo, que não tenha temido pela vida e pela sua dignidade, que nunca tenha sido humilhada, que nunca se tenha sentido incomodada e desconfortável com comentários, piropos, etc.

Quando ainda há quem diga que o feminismo é ser "radical", que o feminismo quer acabar com os homens, que as mulheres têm os mesmos direitos e deveres do que os homens, etc, etc, etc... percebemos que há muitos milhares de quilómetros por percorrer... que vamos continuar a ter medo, que as nossas filhas vão continuar a ter medo e, quiçá, as nossas netas também. Enquanto houver quem considere o feminismo um grupo de loucas (preconceito machista) que quer acabar com os homens, as mulheres continuarão em perigo!

Por acaso um homem saberá o que é ter medo de andar na rua? E não estou a falar de ser assaltado, ser assaltado é um mal menor... é ter medo de que, ao virar da esquina, esteja um sujeito que nos apalpará, que nos perseguirá e nos violará... esse sujeito não tem medo! Esse sujeito sabe que a sociedade o protegerá, que sairá impune ou, quando muito, terá uma pena leve e desagravada, afinal ela estava a pedi-las, vinha de mini-saia, estava sozinha, estava com os copos, ele até nem tem antecedentes, é bom rapaz, bom filho, estudante ou um trabalhador exemplar.... até é casado e tem filhos... terá mesmo violado aquela mulher?... como disse um juíz há uns tempos, "Ninguém a violou! A senhora é feia e ninguém quer violar uma pessoa assim. Está a mentir!" ou o juíz que considerou que a violação de um rapaz a uma rapariga não teria sido grave, afinal ele é bem apessoado, filho de boas famílias, sem atecendentes, estudante universitário, com um futuro brilhante pela frente... saiu em liberdade com uma repreensão ou pena suspensa ou lá o que foi, tendo-se provado que tinha havido violação.

Ser mulher é viver com medo, muito medo! Um medo constante de que algo nos aconteça... um apalpão no metro; um sujeito a masturbar-se no jardim enquanto olha para nós; uma mensagem com a fotografia de uma pila enviada para o nosso telemóvel; um "comia-te toda, oh jeitosa!" gritado do outro lado da rua; um beijo forçado na escola; um "ela é uma vaca, puta, cabra, histérica, etc, etc" dito após um "não"; um grupo de colegas de turma a babarem-se e a proferirem comentários sobre as nossas mamas e os nossos rabos em plena aula de educação física enquanto o professor (e professora, o machismo é transversal) diz: "não ligues, são só rapazes a serem parvos", sem castigo, sem punição; ter uma fotografia nossa, enviada de forma privada, exposta por toda a internet (claro que a culpa foi nossa, não a tivéssemos enviado. Relembro, uma foto privada!); toda a escola, trabalho, bairro (o que for) ficar a saber que fomos para a cama com fulano, somos umas putas (ele é um herói, claro!); estar num trabalho, com outras colegas, e ouvir o cliente dizer "esta é para casar, as outras só servem para levar para a cama" e todos rirem muito; ter colegas a comentar com outros a nossa prestação sexual (sendo verdade ou mentira... ninguém vai acreditar que foi mentira e que aquele elemento nunca nos viu o rabo, quanto mais ter ido para a cama connosco); ouvir um adulto dizer de uma adolescente, "se ela fosse maior de idade marchava!"; ter um tipo que nos persegue, de pila à mostra desde o metro, em plena luz do dia, a proferir ordinarices, quando nós temos 14 anos; levar tareia dos maridos/companheiros e ter de fugir, viver fugida numa casa de acolhimento; sermos violadas, em casa, na rua, numa discoteca, num jardim, apresentar queixa e ser posta em causa? Haver atenuantes?... atenuantes para uma violação??!??!... haverá algum homem que sonhe sequer pelo que uma mulher passa? Saberão o medo que é estacionar o carro à noite, na nossa rua ou noutra perto, depois de um serão a trabalhar, das aulas na faculdade, de um jantar, de casa do nossos pais e ter medo de chegar à porta do prédio?... medo! Pânico!

Dizer que o feminismo é radical é perpetuar tudo isto! O feminismo não quer acabar com os homens, o feminismo quer que as mulheres deixem de ter motivos para terem medo!

Quantos de vocês, homens, já teve medo de ir sozinho ao cinema? De ir jantar fora sozinho? De ir na rua sozinho? De ir à praia sozinho? De viver sozinho? De apanhar um táxi sozinho?

Todos os exemplos que dei acima aconteceram, são reais! Uns passaram-se comigo, outros com pessoas muito próximas, tenho 2 irmãs estão lá situações com as duas em momentos diferentes, passaram-se com as minhas filhas, com amigas... são todas histórias reais, pensem nisso!

Eu já temi pela minha vida, na rua, num táxi, em casa, no trabalho... sempre por causa de homens! Felizmente sempre por homens estranhos, não eram familiares, nem amigos, nem conhecidos. Mas temi pela minha integridade. O maior medo que tive sempre foi o de ser violada! Nunca me passou pela cabeça ser assaltada (apesar de já ter sido) ou assassinada, mas todas estas situações que me fizeram temer pela minha integridade foram sempre de cariz sexual, de abuso. A primeira vez que temi por mim tinha 11 ou 12 anos, na rua, de dia e fui apalpada por um grupo de rapazes mais velhos, uns 5 ou 6, que só pararam quando cheguei à porta de casa e uma vizinha estava à janela e gritou... é traumatizante! É humilhante! Ninguém tem o direito de mexer no corpo de outra pessoa sem autorização! Não é uma brincadeira de miúdos, é abuso! É abuso que é aprendido e normalizado desde sempre. Cabe-nos a nós, sociedade, mudar isso. Não nos calarmos, não normalizarmos e nunca culparmos a vítima. A vítima jamais é culpada de nada!

Neste caso que nos chocou a todos, o individuo assume o que fez, os colegas corroboram, o INEM é chamado, a rapariga é identificada e confirma e o chefe da PSP, a Directora da Instituição onde o individuo vive (ou viveu) dizem que é mentira! Que ele mentiu!... porra! Mas que merda de sociedade é esta?!?!...

O feminismo é preciso, é urgente mudar isto, e precisa de todos nós! Homens e mulheres!

Aos homens peço que se ponham, por um segundo, no nosso lugar e imaginem o que é viver com medo de andar na rua. Medo de ser abusada e violada. Hoje, ou amanhã, quando forem pôr o lixo à noite, pensem que uma mulher tem medo de o fazer.

 

Ps. Qualquer comentário abusivo neste post não será publicado e será denunciado! Vão lá ser machozinhos recalcados para o raio que vos parta... Grata!

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