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A Marquesa de Marvila

Aqui não se aprende nada... Lêem-se coisas escritas por mim, parvoíces na maioria das vezes mas sempre, sempre verdades absolutas (pelo menos para mim).

Não! Não é um feliz dia da mulher!

Não me desejem feliz dia da mulher! Não, não é um dia feliz e eu, nem nenhuma mulher, precisa da vossa condescendência.

Este é, para mim, um dia de luto e de luta, não é um dia feliz!

Não precisamos das vossas flores, dos chocolates nem tampouco de promoções. Marcas, a sério?!?... Promoções do dia da mulher!... até quando vão continuar com esta condescendência, a tratar-nos como se fossemos um ser menor que precisa de receber presentes para ficar feliz....

- Ah, elas querem igualdade de salário?!? Eh pá, dá-lhes antes um desconto de 25% em batons e perfumes, assim como assim ficam mais felizes... aumento de salário para quê se podem ter um mega desconto em lingerie, ténis, perfumes, malas e cenas várias?!?... afinal, elas gostam é de compras... fazemos como se faz aos cães, abanamos-lhes com o que gostam à frente do nariz e elas calam-se com essa cena de igualdade salarial!

- Ah, elas querem acabar com a violência doméstica? As violações, o femicídio, o assédio?!?... Eh pá, oferece-lhes flores, chocolates ou assim. Nem imaginas a felicidade das mulheres quando se lhes dá atenção... nunca mais se lembram de direitos fundamentais como respeito, estar viva, etc... elas são assim, contentam-se com uma merda qualquer.

- Ah, elas querem direitos iguais aos dos homens?!... um "Feliz dia Da Mulher" resolve tudo! A seguir sentas-te no sofá enquanto ela faz o jantar, não te esqueças é de lhe levar um bom vinho... 

Não, não me desejem feliz dia da mulher, não me ofereçam flores, chocolates e muito menos descontos! As marcas que me bombardeiam com descontos neste dia ficam logo de parte. Sim, eu tenho mau feitio! E hei-de ter sempre enquanto houver mulher mortas às mãos dos companheiros, enquanto houver diferença salarial, enquanto houver algures no mundo mulheres que não podem votar, que precisam de autorização do marido para respirar, enquanto continuarmos a ser assediadas na rua, a ouvir "bocas" só porque somos mulheres, a sermos postas umas contra as outras (isto é cultural e tem de acabar!!), enquanto houver violação sem punição exemplar, enquanto não pudermos andar na rua tranquilamente, sem medo, enquanto não tivermos as mesmas oportunidades laborais, enquanto continuarmos a ser responsáveis (e culpabilizadas quando não o fazemos) pelas tarefas domésticas e pelos filhos, enquanto houver homens a "ajudar" em casa (uns santos!), enquanto houver meninas obrigadas a casar pelos seus pais, enquanto houver meninas abusadas por familiares...

Não! Este ano de 2021 ainda não é altura para desejar um feliz dia da mulher!

Faltam, neste preciso momento, cerca de 150 anos para as mulheres terem os mesmos direitos dos homens, para atingirmos a igualdade de género! Ainda acham que há motivo para desejarmos um feliz dia da mulher? Fica a reflexão!

Não! Eu não preciso da vossa condescendência!

Sou uma mulher à moda antiga

Eu cá sou uma verdadeira mãe de família, assim no verdadeiro termo da palavra... uma mulher à moda antiga, mesmo! Uma mulher com M grande!!!

Fui educada pela minha querida avó, pessoa que se não tivesse falecido, teria hoje 95 anos. Mulher com um M maior do que o meu, que começou a trabalhar numa fábrica aos 10 anos e por lá trabalhou toda a vida, mesmo após casada, mesmo após ter sido mãe e de ter pedido a sua filha ainda criança, mesmo após ter sido mãe pela segunda vez, mesmo após ter tido uma neta que se lhe alapou às saias mal nasceu e que com ela ia para a fábrica, bebé pequena, miúda se fez naquela fábrica, mesmo após o meu avô ter morrido e com ele ela ter desejado ir... só deixou a fábrica pela saúde que se lhe faltava. Mas não largou a neta, euzinha, e a ela se dedicou dia e noite até morrer.

Vivi com esta Mulher desde que nasci até aos meus 21 anos, quando ela decidiu que estava na hora de ir ter com a sua filha e com o seu marido. A ela devo tudo o que sou, tudo o que sei mas, principalmente a mulher que sou.

Ai caneco, tu és a mulher que qualquer macho gostaria de ter, vero?... Hummmm.... depende!.... se for macho que goste de fazer tarefas domésticas, ir ao super-mercado, beber umas minis comigo e um belo vinho branco, que goste de partilhar os tremoços e as azeitonas, que considere a tarefa de dar banho, biberão, mudar fraldas como parte integrante de ser pai, então sim! Sou mesmo um sonho de mulher para qualquer macho!...

Sou uma mulher à moda antiga, pelo menos à moda que a minha avózinha me ensinou! Sempre, mas sempre me ensinou a ser independente: "Ai, filha, não há nada pior do que dependeres de um homem!", sábias palavras, caneco!, a estudar, a ler (sim, a minha avó era mulher que lia, apesar de apenas ter a 4ª classe não dava erros e era culta), a ver telejornais, a ler jornais.... lembro-me, com especial orgulho, do fascínio que eu sentia quando a via a ler o jornal (coisa que fazia todos os dias), ela era a única avó que eu conhecia que lia jornais, que discutia política e futebol com os homens da família. Sportinguista dos 4 costados, Orientalista de coração e bairro (falei sobre isto no Instagram... quem não me segue no Instagram é um ovo podre!!! Não sei se já vos tinha dito isto.), sabia os nomes dos jogadores, presidentes, directores, discutia com o meu pai as estratégias do presidente, as táticas do futebol... e eu a ouvi-la fascinada! Claro que sou do Sporting desde nascença... acho que ela me teria trocado por outra lá na maternidade se eu não fosse... ninguém iria dar por isso, claro!

A minha avó chateava-se comigo para eu estudar, "vá, que é para não ires parar a uma fábrica como eu! Uma mulher sem estudos não é nada!... tens de ler, tens de saber os rios todos de Portugal, os caminhos de ferro, serras, Distritos, onde e como nasceu Portugal, presidentes, primeiro-ministros, tudo!" Matemática? "Importantíssimo, minha filha! Quem é que te vai fazer as contas?".... e assim fiz! Estudei, com alguma preguiça é certo, mas licenciei-me!... isso ela já não viu, mas morreu a saber que eu nunca tinha chumbado e que se quisesse era boa aluna! Morreu a saber que ler era, para mim, a melhor coisa do mundo! Morreu, com a certeza, de que eu não dependeria de nenhum homem... (o meu pai não conta, vale?)

A minha avó ensinou-me a ser mulher! Nunca me ensinou a estrelar um ovo, nem a aspirar, passar a ferro, limpar... nunca! Levava-me o pequeno-almoço à cama, sempre! Enquanto as forças lhe permitiram, ela acordava-me sempre com o pequeno-almoço e beijinhos! Tão bom!!!!

Nunca adorou ir ao cabeleireiro, tal como eu!, mas andava arranjada, pelo menos enquanto as forças lho permitiam! E dizia-me: "Filha, as pessoas têm de ter brio! Têm de estar limpas e arranjadas! Tu nunca te interesses por um homem porco e que não tenha brio em si!".

Não me ensinou a costurar, também não era coisa que fizesse, não me ensinou a cuidar de uma casa (para ela era óbvio que uma casa tem de se manter minimamente limpa), não me ensinou a bordar, mas ensinou-me a ouvir música, não me ensinou a pôr-me bonita para os outros mas sim para mim, não me ensinou a brincar com bonecas mas ensinou-me a saltar à corda e a jogar ao elástico... aliás, eu nunca adorei brincar com bonecas mas delirava com os carrinhos que ela tinha guardado do meu pai... E ela dizia-me, "filha, não faças como eu... tu tira a carta de condução!". E tirei, assim que tive a idade legal para o fazer... ela viu, e ela andou de carro comigo, e eu levava-a ao médico, a passear, e ela dizia: "Vai mais devagar... não me enerves! Da próxima vez não venho contigo!"...

Ela não me ensinou a cozinhar, nem a lavar roupa, nem a esfregar o chão e dizia-me: "Filha, tu arranja um homem que goste de ti e não faça de ti criada! Tu põe os olhos no teu padrinho, o homem lava, passa, cozinha, faz tudo tal como a tua madrinha! Se o teu avô fosse vivo ele não me iria deixar estar aqui a cozinhar e a esfregar o chão (coisa que ela fazia de joelhos no chão, balde, água e sabão... pela casa toda! Eu ajudava-a, mas ela nunca queria... dizia sempre: Está quieta, só me atrapalhas!)".

A minha avó era uma mulher com M grande e fez de mim uma mulher à moda antiga! Educada por ela, uma mulher antiga, com regras antigas, baseada na sua educação antiga!

Hoje eu sei cozinhar, aprendi sozinha e muitas vezes lhe liguei (de casa da minha mãe, quando lá estava) a perguntar como se fazia isto ou aquilo. Hoje sei lavar roupa (ou melhor a máquina sabe), sei ir ao super-mercado, sei limpar o pó, aspirar e até fazer bolos! Casei com um homem com brio, asseado e que faz tanto ou mais do que eu nesta casa. Temos os dois as mesmas responsabilidades cá em casa! Que gosta de mim e do qual não dependo! Ela iria ter orgulho em mim!

Obrigada avó por fazeres de mim mulher!